Estudo mostra efeito neuroprotetor de tempol em modelo animal de ELA
Em trabalho publicado na revista PlosOne, a professora Ohara Augusto e seu grupo, do INCT — Redoxoma, com a colaboração do professor Antonio Coppi, da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da USP, mostraram efeitos neuroprotetores do nitróxido cíclico tempol em um modelo animal de esclerose lateral amiotrófica (ELA, ou ALS na sigla em inglês), reforçando as evidências de que mecanismos oxidativos estejam envolvidos na doença.
“Nossos dados mostram que o tempol prolongou moderadamente a vida do ratos com ALS, protegendo suas estruturas celulares e moleculares. Isso é uma prova de que nitróxidos cíclicos devem ser melhor estudados e testados no tratamento da ALS” afirmou Ohara.
A ALS é uma doença neurodegenerativa fatal, caracterizada pela disfunção progressiva e morte dos neurônios motores no córtex motor, tronco cerebral e medula. Embora na maioria das vezes a causa da doença seja desconhecida, a chamada ALS esporádica, cerca de 10% dos casos têm base genética. Mutações associadas à ALS foram encontradas em diversos genes, mas mutações no gene da Cu,Zn superóxido dismutase (SOD 1) são as mais estudadas, sendo responsáveis por 20% dos casos familiares. Como a patologia e os sintomas em ambas as formas da doença são semelhantes, suspeita-se de um mecanismo patogênico comum.
O envolvimento de mecanismos oxidativos na patologia da ALS é indicado pela detecção de danos oxidativos em DNA, proteínas e lipídios nas áreas afetadas do Sistema Nervoso Central de pacientes. Por outro lado, danos oxidativos podem exacerbar outros mecanismos que levam à neurodegeneração, contribuindo, possivelmente, para a perda de neurônios. Portanto, mecanismos oxidativos podem contribuir para a evolução da doença independentemente de serem causas primárias ou consequências secundárias de outros processos tóxicos.
Antioxidantes clássicos não têm se mostrado eficientes em testes clínicos para o tratamento da doença, mas em testes com animais experimentais eles mostraram algum efeito protetor. Segundo a pesquisadora, essa contradição tem sido atribuída às baixas concentrações que tais compostos podem atingir no Sistema Nervoso Central.
“O tempol é bastante permeável à barreira hematoencefálica e atua não por um, mas por vários mecanismos antioxidantes. Ele reage com diferentes espécies reativas, sem ser consumido, podendo, portanto, desativar muitas dessas espécies antes de ser metabolizado. Essa é uma importante diferença em relação aos antioxidantes clássicos. Também, embora ainda não comprovado, nossa longa experiência com esses nitróxidos cíclicos sugere que inicialmente eles atuem como oxidantes fracos que disparam respostas adaptativas antioxidantes, tornando o organismo mais resistente a longo prazo”, afirmou.
Testando o tempol
No estudo, foram examinados os efeitos do tempol no aparecimento e progressão da ALS em fêmeas de ratos transgênicos superexpressando a mutante G93A da hSOD1 (ratos G93A). Os animais receberam, por administração oral, 155 mg/dia/rato de tempol, a partir da idade de sete semanas, e tiveram peso corporal e habilidade motora monitorados.
Paralelamente, nas medulas dos animais tratados e não tratados foram analisados: número e volume dos neurônios; os níveis de tempol; alguns parâmetros oxidativos; e os níveis de formas não nativas da hSOD1. Essas formas têm sido consideradas cruciais ao mecanismo patogênico da ALS.
Os resultados mostraram que a administração de uma alta dose de tempol em ratos G93A, embora tenha tido efeito pequeno no aparecimento da doença, desacelerou sua progressão e aumentou em nove dias a sobrevivência dos animais.
“A perda de neurônios motores foi atenuada nos ratos tratados, mas não a atrofia, sugerindo que o tempol atua em fases iniciais do mecanismo patogênico, mas não o reverte. Os níveis de formas não nativas da hSOD1 também decresceram, o que suporta o envolvimento dessas formas na patologia. Essas formas não nativas têm sido detectadas por técnicas imunoquímicas que fornecem poucas informações estruturais. No momento, nosso grupo procura contribuir para melhor caracterizá-las”, explicou Ohara.
A pesquisadora ressalta que, embora os efeitos protetores do tempol observados nos animais tenham sido estimulantes, inclusive quando a droga foi administrada por via intraperitoneal, estudos mais abrangentes são necessários, mas estão além das possiblidades do grupo. “Seria necessário um estudo com centenas de animais e também com modelos que expressam uma só cópia do gene mutante da hSOD1, como é o caso dos pacientes humanos. Tais modelos existem, mas seria necessário acompanhar a doença por quase um ano, o que requer uma grande infraestrutura. Espero que a nossa publicação sirva de estímulo para que estudos mais abrangentes possam ser realizados”.
O artigo Tempol Moderately Extends Survival in a hSOD1G93A ALS Rat Model by Inhibiting Neuronal Cell Loss, Oxidative Damage and Levels of Non-native hSOD1G93A Forms, de Edlaine Linares, Luciana V. Seixas, Janaina N. dos Prazeres, Fernando V. L. Ladd, Aliny A. B. L. Ladd, Antonio A. Coppi e Ohara Augusto, pode ser lido em http://dx.plos.org/10.1371/journal.pone.0055868