Redoxoma

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Ativação da respiração celular depende de concentração ideal de cálcio

Estudo de pesquisadores do Redoxoma é inovador e foi publicado no Journal of Biological Chemistry
PorBy Maria Celia Wider
• CEPIDRIDC Redoxoma
31/01/2023
São Paulo, Braszil

O cálcio é o mineral mais abundante no corpo humano e tem diversas funções biológicas, participando de processos fisiológicos e bioquímicos importantes. Ele é um regulador chave em diversas vias de sinalização intracelular e tem sido implicado no controle metabólico e na função mitocondrial. Sob a forma de íons de cálcio (Ca2+), ele ativa a respiração mitocondrial, ao induzir a atividade de enzimas associadas ao metabolismo oxidativo, regulando assim a geração de adenosina trifosfato (ATP). O ATP é a principal fonte de energia de nossas células. A questão é que, embora conhecida, essa atividade do cálcio na respiração celular não havia sido determinada quantitativamente, ou seja, ninguém ainda havia medido.

Esse foi o desafio da pesquisadora Eloisa A. Vilas-Boas em seu projeto de pós-doutorado, sob a supervisão da professora Alicia Kowaltowski, do Instituto de Química da USP e do CEPID Redoxoma. “Fala-se muito que o cálcio ativa algumas enzimas mitocondriais do ciclo de Krebs, com impacto na produção de ATP. Mas será mesmo? Ninguém mediu. Então o que fizemos foi estudar a respiração em mitocôndrias isoladas do fígado de camundongos e em hepatócitos em cultura, modulando diferentes níveis de cálcio. E mostramos que existe uma faixa ideal de concentração de cálcio em que a respiração mitocondrial é ativada,” afirma Vilas-Boas. Os resultados foram publicados no prestigioso Journal of Biological Chemistry (JBC).

Kowaltowski destaca que o trabalho é muito inovador ao investigar como determinadas concentrações de cálcio alteram o fluxo metabólico. “Se você olha para a quantidade de uma coisa, tem uma fotografia do momento, não sabe quanto está sendo consumido e quanto está sendo produzido. Neste trabalho, a Eloisa está olhando para o fluxo, quanto está sendo transformado dessas moléculas. Isso realmente mostra como está a atividade metabólica”.

Além disso, a pesquisa avaliou a respiração celular em níveis fisiológicos de cálcio, para entender como é regulado o metabolismo de uma célula normal. “Muitas vezes a gente procura por doenças, mas tem lacunas no conhecimento do que acontece numa célula absolutamente normal”, afirmou Kowaltowski.

Cachinhos Dourados

O cálcio afeta quase todos os aspectos da vida celular e suas concentrações intracelulares são rigorosamente controladas. Nas células, a maior parte do cálcio está sequestrada no retículo endoplasmático e nas mitocôndrias. As mitocôndrias são um dos reguladores centrais da homeostase do cálcio, pois elas podem podem captar, absorver e liberar íons de cálcio.

Segundo as pesquisadoras, sabe-se que, nas mitocôndrias, a concentração excessiva de cálcio leva a um processo chamado transição da permeabilidade mitocondrial, no qual a membrana mitocondrial perde a seletividade, comprometendo a síntese de ATP e levando a célula à morte. Níveis moderados de cálcio, por outro lado, podem ativar direta ou indiretamente as enzimas da matriz mitocondrial, possivelmente impactando na produção de ATP.

Para entender de maneira mais global os efeitos do cálcio na respiração mitocondrial, elas monitoraram o efeito de diferentes concentrações de cálcio na taxa de consumo de oxigênio, fazendo um paralelo entre mitocôndrias isoladas do fígado de camundongos e hepatócitos - células do fígado - em cultura. O fígado é um dos tecido mais importantes para o metabolismo.

Vilas-Boas explica que, para estudar as mitocôndrias isoladas foram usados vários substratos e diferentes concentrações de cálcio. A análise foi feita com o uso de um equipamento chamado Oroboros, um respirômetro de alta resolução que permite medir o consumo de oxigênio nas mitocôndrias de acordo com o tempo. Nas células intactas, foram usados moduladores, tanto um quelante para tirar o cálcio intracelular, o que levou à diminuição da respiração, quanto estratégias para aumentar a concentração de cálcio. As células intactas foram estudadas com o uso do analisador Seahorse, que permite medir a taxa de consumo de oxigênio de células vivas em condições de cultura. “Ambos os aparelhos são de alta resolução e avaliam coisas parecidas. Com eles é possível medir variações pequenas de oxigênio, o que não conseguíamos fazer antes.”

Aumento dos níveis de cálcio em mitocôndrias de hepatócitos
Aumento dos níveis de cálcio em mitocôndrias de hepatócitos: à esquerda na condição controle, no centro logo após adição de tapsigargina (TG), droga que aumenta o cálcio, e à direita no tempo final – Imagem: Eloisa Vilas-Boas

Os resultados mostraram que as concentrações de cálcio impactam fortemente a respiração mitocondrial, com um efeito do tipo Cachinhos Dourados, no qual tanto muito quanto pouco cálcio limitam a fosforilação oxidativa, mas a concentração “na medida certa” promove ativação significativa.

Em todas as situações, os níveis de cálcio foram quantificados. “Além da medida do cálcio citosólico, fiz um experimento que mostrou o cálcio dentro da mitocôndria. Com isso demonstrei que realmente ele precisa entrar na mitocôndria para provocar o efeito,” afirmou a pesquisadora.

Segundo Kowaltowski, o interessante foi observar que a célula mantém os níveis de cálcio mitocondrial em uma faixa ideal para a respiração. “A célula normalmente não se mantém no máximo de produção de ATP. Ela pode aumentar essa produção, de acordo com a demanda, e mantém os níveis de cálcio necessários para isso.”

O artigo Goldilocks calcium concentrations and the regulation of oxidative phosphorylation: too much, too little, or just right, de Eloisa A. Vilas-Boas, João Victor Cabral-Costa, Vitor M. Ramos, Camille C. Caldeira da Silva e Alicia J. Kowaltowski, pode ser lido aqui.