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Exercício aeróbico favorece a regeneração muscular

Mecanismo envolve inibição da respiração mitocondrial em células-tronco musculares
PorBy Maria Celia Wider
• CEPIDRIDC Redoxoma
04/08/2020
São Paulo, Braszil

A prática de exercícios físicos promove o aumento do pool de células-tronco musculares, responsáveis pela regeneração e manutenção do tecido muscular. Para entender o mecanismo molecular por trás deste fenômeno, cientistas investigaram as funções e características metabólicas dessas células em camundongos submetidos a treinamento aeróbico. Eles descobriram que os efeitos benéficos do exercício estão associados à reprogramação metabólica das células-tronco, incluindo a redução da respiração mitocondrial. A inibição do consumo de oxigênio pelas mitocôndrias provoca o aumento da autorrenovação das células-tronco musculares, melhorando a capacidade regenerativa dos músculos.

O estudo foi realizado pelo pós-doutorando Phablo Abreu, sob supervisão da professora Alicia Kowaltowski, do Instituto de Química da USP e do CEPID Redoxoma, e os resultados foram publicados no Journal of Cachexia, Sarcopenia and Muscle.

“É a primeira vez que a gente consegue ver alterações metabólicas em mitocôndrias de células-tronco musculares de animais submetidos a exercício físico e também consegue alterar o destino, o caminho, dessas células-tronco, alterando seu metabolismo in vitro”, afirmou Kowaltowski.

A perda de massa muscular é um dos principais indicativos de envelhecimento não saudável em humanos e ocorre também em várias doenças graves. Pessoas com alguns tipos de tumores, por exemplo, desenvolvem caquexia, que é caracterizada por perda de peso e atrofia muscular. “Por isso a preservação da massa muscular é tão importante. Entender o que rege a célula-tronco do músculo, e por quais mecanismos, é fundamental para podermos melhorar terapias que preservem o músculo a longo prazo”.

Para Phablo Abreu, que também é educador físico, “esse trabalho abre interessantes perspectivas para novas pesquisas sobre a prática de exercícios. Por exemplo, sabendo que no envelhecimento ocorre a diminuição de células-tronco musculares, o que vai acontecer, então, se um idoso se exercitar?”. E ele aconselha a todos: “exercitem-se!”

Inibição da respiração mitocondrial

No estudo, camundongos adultos jovens foram submetidos a corrida numa esteira motorizada uma hora por dia, cinco dias por semana, por cinco semanas, com aumento gradual da velocidade. Os pesquisadores, então, realizaram experimentos in vivo e in vitro, para investigar a função, diferenciação e características metabólicas de células-tronco musculares, também chamadas de células satélites.

Inicialmente, eles constataram que animais exercitados apresentavam melhor condicionamento físico, consumiam mais oxigênio, queimavam mais calorias e se movimentavam mais, em comparação com animais controle sedentários. Outra observação foi que no final do período de treinamento físico os animais apresentaram uma redução significativa da massa corporal. “A redução da massa corporal estava ligada à redução da área de tecido gorduroso e à preservação da massa muscular, confirmando o que já é bem conhecido: que o exercício físico aeróbio é uma excelente ferramenta na perda de massa gordurosa e controle da dieta para perda de peso”, disse Phablo Abreu.

Em nível celular e molecular, os pesquisadores investigaram a expansão do pool de células-tronco em animais exercitados. As células-tronco musculares permanecem em estado quiescente, dormente, e são ativadas em resposta a um estímulo, como lesão, por exemplo. Como explica Phablo, essas células podem se tornar células musculares, como o mioblasto, ou se dividir em células-tronco iguais às originais. No primeiro caso o processo é chamado de diferenciação; no segundo, de autorrenovação. “Nas células-tronco dos animais exercitados os marcadores de autorrenovação estavam aumentados. Vimos que o exercício estava expandindo o estado ”tronco“, ou stemness, em tecido adulto, o que é importante para regeneração do tecido e manutenção da função ao longo da vida”.

E, de fato, analisando tecidos lesionados, eles viram que os músculos de animais exercitados têm melhor eficiência regenerativa, com reparo muscular acelerado, menos células inflamatórias e menor indução de fibrose, na comparação com músculos de animais controle.

O passo seguinte foi estudar o estado metabólico das células-tronco isoladas, considerando que essas células estão ancoradas no tecido muscular maduro, o qual consome mais oxigênio e gera mais energia após o treinamento aeróbico. Os pesquisadores mediram a respiração das células dos animais exercitados e dos sedentários e viram que todos os parâmetros respiratórios estavam diminuídos nas células de animais exercitados. “Para nossa surpresa, a respiração mitocondrial, que é um fator que mostra como está o metabolismo de modo geral, era bem mais baixa na célula-tronco do animal exercitado. Isso é inesperado porque o resto do músculo está respirando mais. Mas nunca ninguém havia medido, então não sabíamos o que estava acontecendo”, disse Kowaltowski.

Para comprovar a relação entre a redução da respiração mitocondrial e a autorrenovação das células satélites, os pesquisadores inibiram artificialmente a respiração de células controle e viram que elas se tornaram mais autorrenováveis. “Quando a respiração de uma célula controle é inibida, todos os marcadores de autorrenovação se parecem com os de uma célula exercitada.” Isso demonstra que a autorrenovação é causada pela inibição respiratória observada nas células exercitadas. Eles também transplantaram essas células em um animal e viram que elas geravam menos inflamação após lesão, comportando-se como as células dos animais exercitados.

Embora tenham conseguido reproduzir em parte os efeitos do exercício em células in vitro, os pesquisadores alertam: “Não temos ainda uma ‘pílula do exercício’, essa intervenção não é aplicável em humanos, pois usamos um veneno, a antimicina, para inibir a respiração mitocondrial das células. Mas, com esse estudo, demos passos importantes para entender como o exercício e o metabolismo de células-tronco musculares aprimoram a regeneração muscular e mantêm o músculo saudável, conferindo, no futuro, um importante alvo terapêutico.”

 O artigo Satellite Cell Self-Renewal in Endurance Exercise is Mediated by Inhibition of Mitochondrial Oxygen Consumption, de Phablo Abreu e Alicia J. Kowaltowski, pode ser lido aqui.

Imagem: Phablo Abreu